O “S” DO ESG E O CAPITALISMO DE STAKEHOLDER
Postado 07/07/2021
Temos as condições perfeitas para reinventar o sistema econômico – mas é preciso uma dose de ousadia
É notório que, de 2019 para cá, a sigla ESG — em inglês, a adoção de critérios ambientais, sociais e de governança na tomada de decisões de investimentos — saiu do nicho e vem ganhando os holofotes, sendo tema de debates e tendo mais espaço na mídia. A pandemia de covid-19 contribuiu em parte para que esse tsunami varresse o universo dos negócios, mas não só ela. O assunto vem sendo tratado nos últimos anos no Fórum Econômico Mundial, que gerencia uma força-tarefa global para promover maior transparência sobre a exposição das empresas aos riscos climáticos, e está presente também nas cartas aos investidores de Larry Fink, CEO da gestora BlackRock, responsáveis por ditar tendências de mercado com ênfase na sustentabilidade e descarbonização das carteiras de ativos.
No mesmo cenário emergiu o conceito do capitalismo de stakeholder (partes interessadas) em contraponto ao capitalismo de shareholder (acionista) — em agosto de 2019, os CEOs de 181 empresas americanas assinaram um manifesto indicando que a supremacia do lucro acima de tudo estava chegando ao fim e que deveria dar lugar a um novo capitalismo, mais centrado nos públicos com os quais as empresas interagem — consumidores, trabalhadores, fornecedores, comunidades vizinhas, governos, mídia, organizações da sociedade civil. O “S” do ESG, afinal, contempla as diversas camadas da dimensão social dos negócios.
O World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), rede de conselhos empresariais pela sustentabilidade do qual o CEBDS faz parte, compartilha dessa visão e tem conclamado as companhias a marcar o passo rumo à reinvenção do capitalismo. Entendemos que o mundo, hoje, enfrenta três grandes pressões: a emergência climática, a perda da biodiversidade e as desigualdades crescentes — e todas exigem uma mudança na mentalidade e na postura dos negócios.
O capitalismo de que precisamos é o que recompensa a verdadeira criação de valor, não a extração de valor feita pelo modelo atual, e internaliza os custos sociais e ambientais. Será preciso construir a resiliência de longo prazo, para que as empresas possam absorver e se adaptar a todas as transformações que vêm ocorrendo e também contemplar uma abordagem regenerativa: não basta só preservar o que existe, é preciso criar estratégicas que restauram os ecossistemas dos quais os negócios dependem. Em resumo, o novo capitalismo é orientado para os stakeholders, internaliza os impactos, tem visão de longo prazo, é regenerativo e responsável.
E o Brasil só tem a ganhar: nossas empresas são reconhecidas por enfrentar bem as crises, e pela criatividade na reinvenção dos negócios. Hoje, temos à frente as enormes tarefas de combater a pandemia e empreender uma jornada rumo à recuperação econômica, que oferece inúmeras oportunidades para novas formas de fazer negócios emergirem.
O WRI Brasil calculou o potencial econômico de medidas de recuperação da economia alinhadas com a ação climática e a redução da desigualdade socioeconômica. A retomada baseada na economia verde pode fazer com que o Brasil retome o crescimento econômico nos próximos dez anos, com um aumento acumulado adicional de produto interno bruto (PIB) de R$ 2,8 trilhões até 2030.
A pandemia de covid-19 expôs a fragilidade do modelo vigente e suas iniquidades. É provável que, com o status quo abalado pela crise sanitária e suas consequências, estejamos vivendo um momento propício para essa reinvenção, o tipo de movimento que só surge a cada 50 anos. Agora é o momento para empresas e investidores entrarem — e liderarem — o debate não apenas sobre se o capitalismo precisa mudar, mas sobre como vamos reinventá-lo. Isso requer uma dose de ousadia e de visão de futuro. Chegou a hora de colocar o “S” – de social, de stakeholder, de sucessão — no centro da conversa.
FONTE: Marina Grossi – Pres. CEBDES.
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