Glob Engenharia Ambiental - HORA DA VERDADE NOS CRÉDITOS DE CO2

HORA DA VERDADE NOS CRÉDITOS DE CO2

Postado 25/05/2023

Os próximos meses prometem ser decisivos para o futuro do mercado voluntário de créditos de carbono. Os reflexos serão sentidos no coração da Amazônia, onde empresas brasileiras vêm fazendo investimentos milionários para lucrar com a proteção da floresta.

Existe um problema de confiança dos dois lados da equação. Os vendedores precisam provar que estão entregando as prometidas reduções ou remoções de gases de efeito estufa da atmosfera. 

E, sob crescentes acusações de greenwashing, os compradores têm de se certificar de que as afirmações públicas feitas com base na compra de créditos têm fundamento.

Desde sua concepção, há 15 anos, a ideia de compensar emissões de CO2 é alvo de críticas que vão da falta de transparência na formação de preços às alegações de que os offsets seriam uma “licença para poluir”.

A demanda criada pela onda de compromissos corporativos net zero parecia o sinal de que as atribulações tinham ficado para trás. O volume de transações e a geração de créditos dobraram entre 2020 e 2021. Mas no ano passado o mercado, ainda incipiente, andou de lado. 

• No primeiro trimestre deste ano, as emissões de novos créditos caíram 26% em comparação com o mesmo período do ano passado, segundo a Sylvera, uma startup que faz ratings desses ativos.

É o quanto caiu o uso efetivo para compensações por parte dos compradores finais, que corresponde à retirada dos créditos de circulação, de acordo com a Sylvera, nos três primeiros meses do ano. Essa prática, chamada de “aposentadoria”, é considerada o principal indicador da saúde do mercado

Mas quais são de fato os problemas? Do lado dos vendedores, as críticas têm se concentrado no sistema chamado REDD+, projetos que geram créditos de carbono em troca da proteção de áreas de vegetação nativa ameaçadas pelo desmatamento. 

Reportagens publicadas no começo do ano por um consórcio dos jornais The Guardian e Die Zeit e do site SourceMaterial caíram como uma bomba no setor.

Baseados em estudos acadêmicos, os veículos analisaram créditos de carbono de desmatamento evitado e concluíram que 94% deles mentiam ou exageravam seu impacto climático.

Embora contestada por suas inconsistências metodológicas, a análise deixou os compradores com medo, diz Janaína Dallan, co-CEO da desenvolvedora Carbonext.

O Guardian critica especificamente a forma de cálculo dos projetos de REDD. 

• Grosso modo, traça-se uma linha de base da devastação esperada caso não se faça nada; a partir disso, calcula-se qual o desmatamento evitado pelo projeto de conservação, o que é convertido em toneladas de CO2.

• O problema está na tentativa de “prever o futuro”. A Verra, principal certificadora de créditos do mercado voluntário, estabeleceu uma série de premissas detalhadas que podem ser usadas em sua metodologia. 

• Mas o fato é que quanto mais o responsável pelo projeto puxa para cima o potencial de desmatamento, mais créditos ele gera e mais dinheiro ele ganha.

As desenvolvedoras de projeto brasileiras, reunidas na Aliança Brasil Nature-Based Solutions, afirmam que as reportagens se basearam em um método equivocado e fizeram extrapolações indevidas.

A Verra afirmou que suas metodologias garantem “linhas de base robustas” para medir o impacto de projetos REDD. 

Um dos desafios imediatos para as desenvolvedoras é provar que nem todas as empresas são iguais. “Tem projeto ruim? Tem. Tem linha de base inflada? Tem. Mas não é tudo farinha do mesmo saco”, diz Janaína Dallan, da Carbonext.

Outro aspecto fundamental da discussão é que o desmatamento é uma ameaça real e os créditos de carbono se apresentam hoje como o principal mecanismo financeiro para bancar a conservação de florestas. Invalidar os projetos REDD+ de forma indiscriminada equivale a cortar os recursos que começam a se tornar disponíveis.

Na ponta compradora… Hoje, vários tipos de declarações públicas ou campanhas de marketing que anunciam “neutralidade de carbono” se baseiam nessas compensações, ou offsets, em inglês.

Mas um movimento nascente na Europa quer impor limites mais estritos sobre as comunicações com os consumidores, inclusive as sustentadas em compensações de carbono. 

Um estudo recente da Comissão Europeia apontou que, de um grupo de 150 afirmações ambientais ou climáticas, mais de metade era “vaga, enganosa ou infundada”.

No Reino Unido, uma proposta em estudos só vai permitir declarações como “neutro em carbono” mediante comprovações.

SUBINDO (DEMAIS?) A BARRA

Além das medidas regulatórias, um conjunto de iniciativas voluntárias serão divulgadas nas próximas semanas para estabelecer patamares mínimos de confiança para todos os participantes do mercado

• Batizada de Core Carbon Principles (CCP), a iniciativa divulgou no fim de março uma lista de princípios básicos que devem ser observados pelos vendedores. A parte mais aguardada do trabalho, prometida para meados do ano, é sobre como se dará a aplicação prática dos princípios. O objetivo final é que os créditos sejam emitidos com um selo que ateste integridade climática, ambiental e social.

• Do lado dos compradores, duas iniciativas de autorregulação correm em paralelo. O Voluntary Carbon Markets Integrity Initiative, entidade que atua do lado dos compradores de créditos de carbono, vai publicar no final de junho um código de conduta próprio.

• A Science-Based Targets Iinitiative, que confere um selo de qualidade para os planos net zero das empresas, também deve divulgar nos próximos meses seu próprio conjunto de orientações.

Do lado dos desenvolvedores, existe o temor de que o pacote de exigências seja rigoroso demais. “Governança é um exemplo. Uma coisa é pedir isso na Europa, outra é na República Democrática do Congo ou no interior do Pará”, diz Plinio Ribeiro, da Biofílica Ambipar.

Ele acredita que as novas normas serão importantes e lembra que a própria Verra vai soltar uma atualização metodológica até o fim do ano. "Houve um choque inegável, mas acredito que também veremos mudanças relevantes. Houve uma reação forte do lado da oferta."

Do lado dos compradores, ninguém vai se pronunciar abertamente contra medidas que evitem o greenwashing, mas essas tentativas todas de endurecimento das “regras de uso” dos créditos podem simplesmente fazer com que parte significativa da demanda desapareça.

Uma ideia que vem ganhando adeptos atribui aos créditos somente uma “contribuição” para o clima e o desenvolvimento sustentável, e não mais uma compensação por emissões de CO2. 

“É uma maneira mais honesta para as empresas se comunicarem”, afirma Jonathan Crook, da Carbon Market Watch, centro de estudos europeu especializado na política de carbono.

FONTE: www.capitalreset.com

 

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